Ministério Público avalia que retomada de aulas no Paraná é precipitada

O Gabinete Integrado de Acompanhamento da Epidemia de Covid-19 Paraná (Giac-PR) emitiu, nesta quinta-feira (10 de setembro), comunicado a respeito da retomada das aulas no Estado. O Gabinete é formado por representantes do Ministério Pùblico do Trabalho (MPT-PR), Ministério Público Federal (MPF-PR) e Ministério Público do Estado do Paraná.

No documento, os membros signatários (veja abaixo) avaliam ser precipitado e de elevado risco, neste momento, o retorno às aulas presenciais, além de ressaltar a necessidade de aperfeiçoar o Protocolo de Retorno, “especialmente porque não é possível concluir que há garantia formal de que todas as medidas nele postas sejam possíveis de serem implementadas.”

Assinam o comunicado:

Margaret Matos de Carvalho – Procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho no Paraná (MPT-PR)
Marília Massignan Coppla – Procuradora do Trabalho e coordenadora Regional da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente de Trabalho do MPT-PR
Marco Antonio Teixeira – Procurador de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção à Saúde Pública do Ministério Público do Estado do Paraná
Indira Bolsoni Pinheiro – Procuradora da República titular da Procuradoria Regional de Defesa dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal
Raphael Otávio Bueno Santos – Procurador da República no Município de Londrina

Nesta sexta-feira, 11, Guarapuava, na região central do Paraná, anunciou o plano de retomar as aulas dia 28 de setembro.

Foto Eduardo Matysiak Futura Press

Confira íntegra:

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ – CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA DE PROTEÇÃO À SAÚDE PÚBLICA, pelo seu Coordenador, Procurador de Justiça, Dr. Marco Antonio Teixeira e o CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTES E DA EDUCAÇÃO, pelo seu Coordenador, Procurador de Justiça, Dr. Márcio Teixeira dos Santos, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA NONA REGIÃO, por sua Procuradora-Chefe, Dra. Margaret Matos de Carvalho e pela Coordenadora Regional da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente de Trabalho do Ministério Público do Trabalho, Dra. Marília Massignan Coppla, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Procuradora da República, Dra. Indira Bolsoni Pinheiro, titular da PROCURADORIA REGIONAL DE DEFESA DOS DIREITOS DO CIDADÃO, e pelo Procurador da República na PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO MUNICÍPIO DE LONDRINA, Dr. Raphael Otávio Bueno Santos, assinam o presente documento, para o que adota, no quanto cabível, os fundamentos da NOTA TÉCNICA CONJUNTA MPPA/MPF/MPT Nº 1/2020, firmada pelo Ministério Público do Estado do Pará – PPA, Ministério Público Federal – Procuradoria da República no Pará e pelo Ministério Público do Trabalho no Pará e Amapá, que segue anexa ao presente documento. Para tanto, o Comunicado Considera que o Ministério Público tomou conhecimento, através do noticiário, da intenção de várias instituições, inclusive de alguns gestores municipais, de retorno às atividades presenciais nas escolas públicas e privadas, o que avalia, neste momento, como atitude precipitada, tendo em vista os ainda presentes elevados riscos à saúde de crianças, adolescentes, professores e demais profissionais da educação ou de áreas conexas diante da progressão de pandemia de COVID-19, Considera que o retorno às aulas envolve não apenas a área da infância e juventude, mas também a área da educação, área da saúde e a área do trabalho, o que impõe a busca de uma solução jurídica mais adequada e equilibrada, Considera o Parecer nº 5/2020, do Conselho Nacional da Educação, que reforça a incumbência ministerial ao dispor que, no processo de reorganização dos calendários escolares, a medida deve ser acompanhada pelos Ministérios Públicos nos Estados e Municípios, Considera que o Supremo Tribunal Federal, ao deferir medida cautelar em diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade ajuizadas contra a MP 966/2020 (v.g., ADI n. 6428), deu interpretação conforme à Constituição Federal, a fim de estabelecer que as decisões do gestor público em relação à pandemia atual devem sempre estar baseadas em critérios técnico-científicos e jamais se divorciar dos princípios da prevenção e precaução, em especial com observância às normas e orientações da Organização Mundial da Saúde, Considera que a autorização para retomada das atividades educacionais presenciais pressupõe, em caráter mandatório, a existência, utilização e prévia publicização de uma matriz de risco, por parte do Estado e dos Municípios, que fundamente o ato, ou seja, dê-se-o a conhecer, esclarecendo qual é a referência científica de inteligência epidemiológica que se emprega para conferir a segurança devida às práticas liberadas, e como torná-las possíveis de aferição administrativa e judicial; Considera, sob esse aspecto, ser pressuposto da matriz um modelo matemático idôneo e referenciado tecnicamente, em que as “estimativas da probabilidade sejam combinadas com as estimativas das consequências” (cf. Ministério da Saúde, Boletim Epidemiológico n. 11, de 17.4.20), isto é, simplificadamente, a associação de risco e problemas de saúde; Considera imprescindível que a avaliação de risco ocorra no tempo mais próximo possível da data do reinício das atividades presenciais, divulgado-se publicamente tal providência; Considera, como é dado corrente na literatura sanitária, que a avaliação de risco regionalizada, elaborada pelos Municípios tem significado preditivo importante, associada, com a devida sistematização, àquela produzida pelo Estado. Considera que as médias de morbiletalidade e de ocupação de leitos hospitalares de extensas porções territoriais (como o Estado, por exemplo), por sujeitar populações fragilizadas, porque abaixo da linha média, devem ser objeto de rigoroso critério autorizativo, pelos excessivos fatores de periculosidade para a vida e a saúde ínsitos a esses grupos; Considera indispensável que o Estado assuma, em relação aos municípios medidas assertivas de organização e coordenação de ações e serviços que lhe cabem na área educacional (e não meramente exortativas), evitando disparidades regulatórias entre decretos expedidos pelos entes federativos, causadoras de dúvidas, indevida exposição a perigo e, até mesmo, perplexidades na comunidade em geral, para além de induzir desnecessária judicialização; Considera absolutamente necessário que no plano ou protocolo de retorno às aulas conste, específicamente, quais as obrigações que assumem a Secretaria de Estado e a de Educação evitando carrear somente para a comunidade escolar a responsabilidade integral pelo acompanhamento, cuidados e cautelas no curso das atividades letivas; Considera que, no âmbito da saúde, haja o referenciamento do estabelecimento escolar para a Unidade Básica de Saúde mais próxima para orientação e ocasional atendimento às situações imprevistas (principalmente as que envolvam a proteção à saúde da pessoa), dirimir incertezas de cuidado e instruir sobre fatos que possam constituir risco sanitário e para os quais a instituição não se sinta segura para decidir e/ou atuar; Considera que, para a consecução da providência acima, estabeleça-se, com a brevidade possível, ouvidas a respeito as instâncias implicadas (Secretarias Municipais de Saúde, Secretaria Estadual de Saúde, CIB Regional e CIB Estadual), a devida pactuação entre os entes federativos; Considera que, por tais princípios, impõe-se aos agentes públicos a demonstração de que a medida liberatória tomada ou fomentada não compromete a saúde das pessoas, cabendo-lhes, pois, a comprovação cabal da segurança epidemiológica dessa conduta; Considera que, para os critérios de aferição do controle da transmissão, a OMS indica que o lapso de duas semanas é concebido como o período mínimo de avaliação de tendência, por ser o tempo máximo da incubação da doença (dessa forma, estabeleceu o seguinte indicador como principal indício de que há algum controle da doença: número de reprodução efetivo (Rt) < 1 por pelo menos duas semanas; Considera que a capacidade de detecção e gerenciamento de novos casos pelo Sistema de Vigilância em Saúde Pública é outro critério indispensável, previsto pela Organização Mundial da Saúde, que há de ser demonstrado pelos gestores públicos como pressuposto para reabertura segura das atividades educacionais, Considera que deve ser comprovado pelo poder público, previamente à retomada das atividades escolares presenciais, que as escolas – públicas e privadas – efetivamente possuam as condições necessárias, inclusive estruturais, necessárias para cumprir, na prática, o Protocolo para Retorno das Aulas Presenciais, que foi elaborado pelo Comitê “Volta às Aulas”, criado por meio do Decreto Estadual nº. 4960, de 2 de julho de 2020 e da Resolução Conjunta n.º 1/2020 – CC/SEED/PR de 6 de julho de 2020; Considera, como sugestão, que no Plano ou Protocolo de Volta (presencial) às Aulas, se avente a instituição, por processo interno e democrático, de comissões de prevenção e acompanhamento das atividades de cuidado em cada estabelecimento, de forma a que as regras a serem observadas efetivamente o sejam; Considera grave omissão, caso assim já não se tenha atuado, não se oportunizar anterior manifestação a respeito da matéria em causa pelos órgãos de controle social com interesse legal na matéria, notadamente os Conselhos Municipais e Estadual de Saúde. Isto posto, os signatários do presente documento publicizam seu entendimento no sentido de ser precipitado e de elevado risco, neste momento, o retorno às aulas presenciais, pelas razões antes elencadas, acrescidas, ainda, da necessidade de aperfeiçoar o Protocolo de Retorno, especialmente porque não é possível concluir que há garantia formal de que todas as medidas nele postas sejam possíveis de serem implementadas A responsabilidade pela saúde de todos é do Estado (lato sensu), conforme dispõe o art. 196 da Constituição Federal, bem como a responsabilidade pela prestação do serviço de educação no país é do poder público e, nos termos do artigo 209 da CF, a iniciativa privada está sujeita ao regramento público. As decisões a serem tomadas pela Administração Pública não são de livre discricionariedade ou lastreadas em motivação vaga e duvidosa, mas antes, direta e obrigatoriamente, vinculadas aos sempre prevalentes princípios protetivos da vida e da saúde, estabelecidos na Constituição Federal e na legislação ordinária, neles compreendida a devida e pública justificação sanitária de tomada de risco. Se diante de um quadro de profunda crise sanitária, da tragédia dos números de novos casos diários, óbitos, subnotificações e testagem insuficiente, onde a única medida que tem se apresentado eficaz para a contenção de propagação do vírus é o distanciamento social ampliado, caso o poder público autorize, sem prévio fundamento técnico-científico e sem respeito aos princípios da precaução e da prevenção, a realização de atividades escolares presenciais, poderá responder administrativa, civil e criminalmente pelos eventuais danos causados, alguns irreparáveis. É imperioso ressaltar, ainda, que será cumprida a responsabilidade dos membros do Ministério Público de fiscalizar, com prioridade e meticulosamente, a estrutura e os protocolos de segurança que devam ser adotados por todos os estabelecimentos de ensino (públicos e privados), e os deveres inerentes à Administração Pública, inclusive mediante a instauração de procedimentos de investigação específicos para cada hipótese em que seja necessária. É preciso fomentar, sobretudo, a participação ampla, contínua e efetiva da comunidade escolar e de todas as instituições direta e indiretamente envolvidas, inscritas no Protocolo de Volta às Aulas ou não, dentre elas as instâncias de controle social ora mencionadas.

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