Escritor Paulo Sandrini indica cinco livros para as férias

O escritor Paulo Sandrini preparou uma lista de cinco livros para ler durante as férias. Confira as dicas:

• A balada do cálamo, de Atiq Rahimi, Estação Liberdade, 2018

Prosa sensível, dotada de um lirismo muito particular, “A balada do cálamo”, livro autobiográfico do escritor e cineasta afegão, relata o trauma do exílio. Composto de reflexões, memórias e imagens caligráficas do alfabeto persa, o livro nos transporta para três períodos da vida de Atiq Rahimi: a infância (no Afeganistão), a adolescência (na Índia) e a chegada à França, país em que se estabelece e se torna escritor.

• A moça do corpo indiferente, de Regina Benitez, Kafka Edições, 2012.

Uma das grandes autoras paranaenses e ainda pouco conhecida entre os nossos leitores, Regina Benitez, em “A moça do corpo indiferente”, nos presenteia com um livro cujos contos – na definição do escritor Nelson de Oliveira – “são curtas invocações às sombras que habitam o supremo Mistério” e nos trazem personagens solitárias, cercadas de gente, animais e plantas mas que quase nunca conseguem ultrapassar as barreiras que as protegem do mundo. Publicada orignalmente em 1965, a obra foi resgatada para uma segunda edição em 2012.

• A raposa já era o caçador, de Herta Müller, Editora Biblioteca Azul, 2014

Este é o livro mais denso indicado aqui, escrito por uma das principais autoras em atividade na literatura mundial, vencedora do Nobel em 2009. Em “A raposa já era o caçador”, a romena Herta Müller, radicada na Alemanha, traz um apuro de linguagem desenvolvido por meio de uma narrativa que instala, para os leitores, um clima de angústia e medo que se desenvolve durante o governo totalitário de Nicolae Ceauşescu, na Romênia do fim da década de 1980. Uma professora e uma operária, amigas, dividem uma moradia em que a cumplicidade serve de refúgio em relação à ditadura vivida no país.  A perseguição e as investigações também são abordadas neste romance e serviram, na vida real, como motivação para que Herta deixasse seu país.

• Porcarias, de Marie Darrieussecq, Companhia das Letras, 1997.

Neste livro a escritora francesa narra a história repleta de absurdo de uma vendedora de perfumes que sofre de bulimia e aos poucos se transforma em uma porca. A presença de Ovídio e Kafka aqui é evidente. Nessa trama muito particular, surge a sátira de uma sociedade marcada fortemente pelo culto à saúde e ao corpo que beira o fascismo. Sem lugares-comuns, Marie Darrieussecq nos presenteia com uma das obras mais interessantes da literatura contemporânea mundial.

• Viagem ao redor do umbigo, de André Knewitz, Urutau, 2023.

Para mim, André Knewitz é um dos autores mais criativos e originais da literatura brasileira atual. Gaúcho de Campo Bom, vive em Curitiba faz anos. Nesse seu segundo livro (o primeiro é “Zumbido”, de 2019), Knewitz nos coloca diante de uma novela provocativa, tanto na forma quanto na temática. Contudo, a obra não se desenvolve a partir de uma trama (coisa rara em nossa literatura hoje pouco inventiva), e é por isso mesmo cheia de lacunas que o leitor necessita preencher. O percurso dos dois personagens, Cego e o jovem ciclista, pelo praticamente deserto litoral gaúcho é marcado pela força das imagens e da sinestesia. É um livro que, apesar da sua curta extensão, nos abre infinitas possibilidades interpretativas. Para quem está passando as férias na praia, fica a dica. Quando o sol estiver insuportável, procure a sombra de uma árvore e se aventure nessa obra transformadora.

Observação: todos esses livros podem ser encontrados nos sites das editoras e livrarias ou na Estante Virtual.

O escritor

Paulo Sandrini é paulista de Vera Cruz, mas vive em Curitiba faz anos. É autor de vários livros, entre eles “O estranho hábito de dormir em pé”, “O Rei era assim”, “Exposição das tripas”, “Osculum obscenum” e “Peixes coloridos de alto-mar”. Participou de coletâneas no Brasil e no exterior (“Contos cruéis – as narrativas mais violentas da literatura brasileira contemporânea”, “Futuro Presente” e “Geração Zero Zero – fricções em rede”, entre outras). Ministra oficinas de criação literária desde 2007. É editor da Kafka Edições e músico compositor no duo Gabardine.