Não é só etarismo. É capitalismo selvagem

O sistema quer que você trabalhe até cada vez mais tarde, mmas não quer te dar emprego quando você envelhece. Essa é a face mais cruel do capitalismo: explora o quanto pode e exclui quando não serve mais.

O problema não é só o etarismo. O problema é o modelo econômico que transforma vidas em números, lucros e descartabilidade. A lógica é clara: enquanto você é jovem, barato e produtivo, é útil. Quando passa dos 40, começa a ser “caro demais”, “desatualizado” ou “difícil de adaptar” — mesmo com décadas de experiência, entrega e compromisso.

Uma realidade estatística: o desemprego estrutural entre os mais velhos

No Brasil, mais de 58% das pessoas desempregadas com mais de 40 anos estão fora do mercado há mais de um ano, segundo dados do IBGE (2023). E entre os que conseguem recolocação, a maioria precisa aceitar salários mais baixos do que ganhava antes. O nome disso é descarte sistemático.

Em muitos casos, essas pessoas têm qualificação, experiência e vontade de contribuir. Ainda assim, enfrentam barreiras invisíveis, como a ideia de que não são “tecnologicamente atualizadas” ou “flexíveis o suficiente” para novas culturas corporativas — ainda que pesquisas mostrem que trabalhadores mais velhos têm menor rotatividade, mais comprometimento e menores taxas de absenteísmo do que os mais jovens.

A contradição: falta gente em muitos postos, mas excluímos quem está pronto para trabalhar

Segundo um levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), 69% das empresas brasileiras têm dificuldade para encontrar profissionais qualificados. No setor de tecnologia, por exemplo, faltam mais de 800 mil profissionais até 2025, de acordo com a Brasscom (Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação).

Ou seja: há milhares de vagas abertas. Contudo, parte significativa da força de trabalho é ignorada por pura questão de idade. Isso mostra que o problema não é a falta de gente para trabalhar, mas sim uma lógica de descarte que escolhe quem “vale a pena” empregar com base em critérios econômicos e preconceituosos.

E o futuro?

Enquanto isso, a reforma da previdência empurra a aposentadoria para os 65 anos (homens) e 62 anos (mulheres), exigindo até 40 anos de contribuição para o valor integral. Mas como contribuir por 40 anos se o mercado começa a fechar as portas aos 45?

Esse é o paradoxo cruel do sistema: obriga a trabalhar por mais tempo, mas impede o acesso ao trabalho justamente na fase da vida em que a estabilidade seria mais necessária. Segundo o Dieese, menos de 25% das pessoas com mais de 60 anos conseguem se manter formalmente empregadas. E para muitas, a informalidade ou o subemprego se tornam as únicas alternativas.

Enquanto se vende o discurso da “requalificação”, do “empreendedorismo tardio”, do “recomece com 60 anos”, há por trás disso a recusa em mudar a lógica que prioriza lucro em vez de dignidade.

A verdade é que o capitalismo não quer pessoas independentes e dignas na maturidade. Ele quer corpos úteis por tempo máximo e custo mínimo. E quando não servem mais, vira problema do indivíduo, nunca do sistema.

Por isso, a luta contra o etarismo não pode ser isolada da luta por outro modelo de sociedade, onde o trabalho seja direito, não punição. E envelhecer seja um processo de respeito, não de descarte.

O problema não é que você envelhece. O problema é que o sistema te joga fora quando isso acontece.

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