Em uma ação pirotécnica não por acaso, o governador Cláudio Castro resolveu “explodir” o Rio de Janeiro — política e simbolicamente — sob o pretexto de combater o tráfico, que existe e ninguém duvida. Mas também não se pode duvidar das segundas intenções do mandatário carioca, reveladas tão logo a operação teve curso. Ele se apressou em dizer que o governo federal não ajudou o Rio — jogando assim um fardo pesado no Palácio do Planalto, que, sob o governo Lula, sempre teve a segurança pública como uma de suas áreas mais críticas.
Mais que isso, Castro mudou completamente a pauta que vinha sendo positiva para o presidente Lula — que atravessava dias de alta projeção internacional, após encontros com líderes estrangeiros e homenagens pelos seus 80 anos, reafirmando a soberania brasileira e sua força diplomática.
Agora, porém, o que se desenha como “operação espetacular” assume contornos de carnificina: nas últimas horas, a mobilização da Polícia Militar e da Polícia Civil envolveu cerca de 2.500 agentes, resultou em ao menos 60 mortos, dezenas de fuzis apreendidos e o uso inédito de drones com explosivos em favelas do Alemão e da Penha — regiões com cerca de 300 mil moradores. A pauta que dominará os jornais nos próximos dias será essa tragédia no Rio, que coloca pessoas inocentes sob extremo risco e abre espaço para uma escalada imprevisível de violência, considerando a possibilidade de retaliação do crime organizado.
Operações hiperletais em áreas densamente povoadas empurram moradores inocentes para a linha de tiro, desorganizam serviços e historicamente não desarticulam a cadeia financeira e logística do crime — armas entram por fronteiras, dinheiro circula por lavagem e liderança criminosa se recompõe. Entidades de direitos humanos e pesquisadores já pedem investigação independente sobre as mortes de hoje e cobram foco em inteligência, rastreamento de armas e finanças e no cumprimento integral da ADPF 635, decisão do STF que impõe limites e protocolos às ações policiais em favelas.
Qualquer que seja a conta, não deve ser boa para o governo federal, que é quem tradicionalmente absorve as frustrações das pessoas com os problemas urbanos.
Foi assim em 2013, quando o gigante acordou. O que acontecerá agora dependerá da fina estratégia e do tempo de reação do governo federal. Que sejam sagazes — pois há ratos e corvos em muitos palácios estaduais querendo ver o circo pegar fogo.