Por Giovanna B. Bertoni*
“Ela é tudo”, lê-se nos posters oficiais de Barbie. E, de fato, ela foi o grande destaque do entretenimento nos últimos meses. Cada nova informação sobre o terceiro projeto da diretora Greta Gerwig levava o público à loucura – e as expectativas para apreciar a obra nas grandes telas cresciam exponencialmente. Tamanha empolgação, vinda talvez da nostalgia invocada pelo visual cartunesco, talvez da curiosidade em ver a famosa boneca criar vida, ou simplesmente de uma grande mistura desses e outros fatores, contribuiu para o enorme sucesso de bilheteria assim que as primeiras datas de exibição foram anunciadas.
As duas horas de duração do filme nos guiam pela a jornada de uma das versões da Barbie (Margot Robbie) conhecendo o mundo real e as complexidades inerentes à vida humana, acompanhada de um Ken (Ryan Gosling) que a ama e não é correspondido. A boneca, – acostumada a viver na utopia matriarcal de Barbieland, onde todas as atividades são protagonizadas por mulheres com vidas impecáveis, livres de preocupações – quando chega ao nosso mundo percebe que a situação aqui é, na verdade, muito diferente do que ela imaginava.
Já era de se esperar, devido as obras anteriores de Greta – Lady Bird (2017) e Adoráveis Mulheres (2019) –, que o filme seria atravessado pela perspectiva feminista característica da diretora, mesmo que isso talvez tenha causado estranhamento a um certo segmento do público (que pela estética, possivelmente, presumia uma narrativa mais infantil).
Mas o que, de fato, surpreendeu foi o quanto Barbie, mesmo com toda sua alegoria humorística e descontração, conseguiu impactar as mulheres nas salas de cinema ao redor do mundo. Os créditos rolam, as luzes se acendem, e testemunhamos a troca de olhares sincera seguida da identificação imediata de cada uma com a narrativa.
Trazendo o inevitável debate da desigualdade de gênero, enquanto tangencia os problemas de uma masculinidade tóxica e explora as complexidades de uma relação entre mãe e filha, a obra se alia à visuais vibrantes, diálogos divertidos e atmosfera lúdica para conquistar o público e perpetuar a discussão acerca desses temas.
O mundo plastificado de Barbie sabe ser profundo e se levar a sério nos momentos necessários.
Mas, mais importante que isso: também sabe exatamente quando voltar a imprimir o humor. Seja se apoiando na ironia, na meta-linguagem ou na autocrítica, o filme encontra uma maneira criativa de retornar à suas bases e se manter um longa descontraído, porém ainda passível de debates que podem perdurar para além das grandes telas – principalmente devido aos variados perfis de público que angariou.
Além disso tudo, a escolha de atrizes e atores também demonstra uma preocupação em reconectar Barbie com a diversidade. Ao longo do filme, somos apresentados a várias versões da boneca – mundialmente famosa por ser loira, branca, magra e de olhos claros – mais passíveis de identificação e representatividade, na tentativa de ressignificar os padrões inalcançáveis de beleza previamente endossados por sua própria figura.
Fica claro, porém, que o filme não chega muito além da superfície dos problemas que aponta. E nem deveria. A mensagem absorvida é digerível justamente por conta dessa característica orgânica de abordagem. O que sentimos ao sair do cinema é uma mistura ideal de descontração pincelada com emoção e reflexão nos momentos necessários.
Barbie, portanto, de forma natural, consegue ser mais do que uma jornada do herói cor-de-rosa. É sobre entender as adversidades e complexidades de estar inserido em uma sociedade tão injusta e, finalmente, se auto reconhecer como parte necessária para que a mudança aconteça. Quem assiste percebe – ainda que entre uma risada e outra – que mesmo por trás de máscaras coloridas, o mundo mantém sua paleta cinza.
*Giovanna B. Bertoni é estudante de Jornalismo em Curitiba; especial para o Revérbero