Reciprocidade é só o começo: é hora de pensar como potência

Os recentes ataques do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao Brasil não são apenas retórica de campanha: têm consequências econômicas concretas. A decisão de aplicar um tarifaço de até 50% sobre produtos brasileiros, acompanhada da abertura de investigações unilaterais contra setores-chave da nossa economia é uma agressão à soberania nacional.

Pior ainda: o movimento foi claramente articulado, com o filho de Bolsonaro há meses nos Estados Unidos justamente empenhado em construir essa ofensiva. O próprio Trump justificou a medida alegando uma suposta “injustiça” contra Bolsonaro e ainda propagou a falsa informação de que os EUA têm déficit comercial com o Brasil, o que não corresponde à realidade.

Trata-se, objetivamente, de um crime de lesa-pátria, em que interesses pessoais e eleitorais foram colocados acima dos interesses nacionais. Essa articulação expõe o grau de servilismo de uma parcela da elite política brasileira, que agora assiste em silêncio à retaliação que ajudou a provocar.

O Brasil não pode aceitar isso calado. Defender nossa soberania é um dever. E Lula está certo ao afirmar que o país saberá responder à altura. Mas o modo como essa resposta será dada precisa ser pensado com precisão.

Retaliar, sim — mas com estratégia. A aplicação da reciprocidade, com tarifas equivalentes sobre produtos dos EUA, é um caminho legítimo. Mas não deve ser o único O Brasil pode usar sua burocracia, sua regulação e sua política externa para incomodar silenciosamente onde mais dói.

É hora de dificultar licenças de grandes empresas americanas no Brasil, rever contratos com fornecedores estratégicos, endurecer regras para as Big Techs — e, se preciso, “colocar o bode na sala”, como diz o ditado. A bala de prata está na capacidade de tornar o ambiente mais hostil para o capital político e econômico que Trump representa.

Essa será uma luta difícil. Mesmo países que compartilham interesses semelhantes aos nossos — como a China — não vão comprar briga direta com os EUA em nosso nome. O apoio será retórico. Por isso, mais do que nunca, é hora de fortalecer parcerias bilaterais, ampliar a integração e reduzir a dependência comercial com Washington.

O Brasil precisa responder. Mas com inteligência, frieza e visão de longo prazo. Sem servir como combustível para o populismo de extrema direita que hoje ameaça novamente o cenário global

É importante destacar que medidas retaliatórias podem gerar consequências negativas para ambas as economias, dado o alto nível de interdependência comercial e financeira entre os dois países. Algumas possíveis medidas incluem:

Se o objetivo é enfraquecer os EUA sem se queimar, o caminho é jogar o jogo geoeconômico com frieza, assim como a China faz. Dificultar licenças e impor restrições indiretas é uma tática eficaz porque:

  • Não configura “sanção aberta” (evitando retaliação direta);
  • Parece “burocracia normal”, mas pode ser direcionada a setores sensíveis dos EUA;
  • Permite negociação discreta (empresas pressionam seu governo para ceder em outros temas).

Como o Brasil Poderia Aplicar Essas Medidas

1. Restrições Ambientais e Regulatórias

  • Atrasos em licenças para mineradoras e petroleiras americanas (Chevron, Exxon, Halliburton):
  • Exigir estudos de impacto ambiental mais detalhados para projetos no pré-sal ou Amazônia.
  • Priorizar licenciamento para empresas europeias (Total, Shell) ou chinesas (CNOOC, Sinopec).
  • Barreiras sanitárias contra o agronegócio dos EUA:
  • Proibir importação de trigo/cloro (justificativa: “risco à saúde”) ou carne bovina (“controle de hormônios”).

2. Regulação Apertada em Tecnologia e Infraestrutura

  • Taxar ou bloquear serviços digitais:
  • Exigir que Google, Meta e Amazon armazenem dados localmente (como o GDPR da UE).
  • Criar taxas de “soberania digital” para plataformas dos EUA.

Atrasos em projetos de infraestrutura:

  • Boeing (contratos de aviação): atrasar certificações de aeronaves.
  • Cisco e Intel (TI governamental): exigir auditorias de “segurança nacional”.

3. Pressão em Setores Financeiros

  • Dificultar fusões e aquisições de empresas americanas no Brasil:
  • CADE (Antitruste) exigir condições absurdas para aprovar compras (ex.: “vender 80% dos ativos”).
  • Taxar remessa de lucros de multinacionais dos EUA (alíquotas extras para “repatriação excessiva”).

4. Guerra Judicial 

Processos trabalhistas

  • McDonald’s, Coca-Cola: multas por “práticas trabalhistas abusivas”.
  • Uber, Netflix: cobrança retroativa de impostos.

Agora, se a escolha for por um embate direto, algumas opções são as seguintes:

1. Barreiras Comerciais e Tarifas

Aumento de tarifas sobre produtos americanos: O Brasil poderia elevar impostos de importação sobre mercadorias dos EUA, como trigo, maquinário, produtos químicos e eletrônicos.

Restrições não tarifárias: Implementar barreiras sanitárias, técnicas ou burocráticas para dificultar a entrada de produtos americanos.

2. Substituição de Importações

Incentivos à produção nacional: Reduzir a dependência de produtos dos EUA estimulando indústrias locais ou buscando fornecedores alternativos (China, União Europeia, Mercosul).

Compras governamentais preferenciais: Priorizar empresas brasileiras ou de países aliados em licitações públicas.

3. Restrições a Empresas Americanas

Tributação adicional: Criar taxas específicas sobre lucros de multinacionais americanas no Brasil.

Regulação mais rígida: Aumentar a fiscalização sobre empresas como Microsoft, Coca-Cola, McDonald’s, etc.

Limitações a setores estratégicos: Restringir investimentos americanos em áreas como defesa, tecnologia e energia.

4. Boicote a Produtos e Serviços dos EUA

Campanhas de conscientização: Estimular o consumo de alternativas nacionais ou de outros países.

Restrições a plataformas digitais: Taxar ou limitar serviços como Amazon, Google e Netflix.

5. Ajustes no Mercado Financeiro

Venda de títulos do Tesouro Americano: Se o Brasil detiver reservas em dólares, poderia liquidar parte desses ativos, afetando a demanda por títulos dos EUA.

Desdolarização parcial: Aumentar acordos em moedas locais (ex.: com China, Rússia) para reduzir dependência do dólar.

6. Ação em Blocos Internacionais

Cooperação com BRICS e Mercosul: Formar alianças para pressionar os EUA coletivamente.

Apoio a contramedidas na OMC: Buscar disputas comerciais contra os EUA na Organização Mundial do Comércio.

Riscos e Considerações

O Brasil tem mecanismos para retaliar, mas deve ponderar os custos econômicos e políticos. Medidas mais eficazes exigiriam alianças internacionais e uma estratégia de longo prazo para reduzir a dependência da economia americana.

.Se o Brasil decidir retaliar economicamente os Estados Unidos, poderia adotar medidas estratégicas para minimizar danos à própria economia enquanto pressiona os EUA. Aqui estão algumas opções eficazes e seletivas:

Retaliação Comercial Direcionada: Ataque a Interesses Corporativos

  • Investigar Google, Meta e Apple por monopólio ou evasão fiscal (como a Europa faz).
  • Exigir armazenamento local de dados ou taxar serviços digitais.
  • Restrições a Empresas com Histórico Controverso:
  • Coca-Cola e Pepsi (por pressão ambiental)

Substituir Importações dos EUA por Fornecedores Alternativos:

China e UE para tecnologia e maquinário; Argentina e Canadá para trigo e produtos agrícolas; Acelerar Acordos com BRICS e Mercosul: Comprar mais da China, Índia e Rússia em vez dos EUA. Fortalecer o comércio em moedas locais (diminuindo uso do dólar).

Em resumo, o Brasil pode retaliar de forma inteligente mirando setores politicamente sensíveis nos EUA (agronegócio, tecnologia e defesa), enquanto reduz sua dependência com diversificação comercial e financeira. O melhor caminho seria uma estratégia gradual, aliada a outros países, para evitar isolamento.

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