A Audiência Pública “Pedágio: impactos sociais, irregularidades e direito de ir e vir”, realizada em outubro na Câmara Municipal da Lapa por iniciativa do vereador Bruno Bux e da deputada federal Carol Dartora, expôs graves denúncias de violações de direitos humanos provocadas pela instalação da praça de pedágio da Concessionária Via Araucária no km 191 da BR-476.
O encontro reuniu autoridades federais, municipais, representantes de comunidades quilombolas e moradores dos distritos diretamente afetados. Estiveram presentes Rui Leandro da Silva Santos, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania; Amilton Fernandes da Silva, da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos; Rozembergue Batista Dias, do Ministério da Igualdade Racial; Nuno Castilho Coimbra da Costa, Defensor Regional de Direitos Humanos no Paraná; Daniel Paulino, da Terra de Direitos; além do prefeito Diego Ribas, do vice-prefeito Fénelon Moreira, do presidente da Câmara Arthur Vidal, vereadores, lideranças quilombolas e representantes da sociedade civil.
O que a audiência revelou
Durante o debate, foram apresentadas denúncias que evidenciam violações de direitos fundamentais: o direito de ir e vir, o acesso à saúde e à educação, a segurança viária e o direito das comunidades tradicionais à consulta prévia e informada — garantido pela Convenção nº 169 da OIT.
Um dos pontos mais graves destacados foi que o Edital do Lote 1 das concessões rodoviárias do Paraná não atendeu às exigências da Convenção 169, já que não houve consulta prévia às comunidades quilombolas afetadas, como Restinga e Feixo, configurando violação direta a normas internacionais assumidas pelo Brasil.
Moradores das localidades de Feixo, Mariental e Restinga relataram prejuízos severos e aumento expressivo de acidentes após a instalação da praça de pedágio, além de restrições ao direito de ir e ir e agravamento das desigualdades sociais e econômicas.
Mesmo com a concessão de 10 passagens mensais pelos cofres municipais, o modelo segue sendo considerado abusivo e insuficiente. O impacto financeiro estimado — cerca de R$ 3 milhões por ano — compromete áreas essenciais como saúde, educação e serviços públicos.
Outros problemas apontados
Também foram denunciadas:
- Falta de segurança viária e aumento de 35% nas mortes na Rodovia do Xisto, por ausência de sinalização, manutenção e fiscalização;
- Serviço de Atendimento ao Usuário (SAU) ineficiente nas regiões da Restinga, Porteira e Bom Sucesso;
- Estrada do Caracol intransitável, impossibilitando seu uso como rota alternativa;
- Ausência de isonomia tarifária entre as praças do Lote 1;
- Falta de medidas compensatórias para os municípios mais impactados;
- Utilização dos recursos arrecadados na Lapa para financiar obras em outras regiões, como o Contorno Norte de Curitiba, gerando desequilíbrio e injustiça social.
Processos judiciais em andamento
Foram mencionadas ações que já tramitam na Justiça Federal:
- Processo nº 5012178-53.2024.4.04.7000 – ação movida pelo Município da Lapa contra a Via Araucária, a União e o Estado do Paraná, pedindo isenção tarifária aos moradores de Mariental;
- Processo nº 5061290-25.2023.4.04.7000 – ação da Defensoria Pública da União contestando o leilão do Lote 1 pela falta de consulta às comunidades tradicionais, em afronta à Convenção 169.
Encaminhamentos da audiência
Entre as medidas definidas estão:
- Elaboração de estudo técnico para viabilizar isenção tarifária ampla aos moradores da Lapa;
- Avaliação da implantação do sistema Free Flow nas praças do Lote 1;
- Denúncias oficiais à ANTT e aos Ministérios dos Transportes, dos Direitos Humanos e da Igualdade Racial;
- Solicitação de esclarecimentos à Prefeitura sobre o andamento das ações judiciais.
O vereador Bruno Bux reforçou que o problema ultrapassa a discussão tarifária:
“O que está em jogo não é apenas o valor da tarifa. É um sistema que nega direitos básicos e transfere recursos de comunidades vulneráveis para obras em regiões já privilegiadas. O pedágio da Lapa se tornou um obstáculo à cidadania, à mobilidade e à justiça social.”
A ausência da ANTT e da Concessionária Via Araucária, apesar dos convites oficiais, foi registrada em ata e classificada como lamentável.
E agora?
Desde outubro, moradores, lideranças e parlamentares seguem pressionando por mudanças, mas os problemas persistem: o modelo de cobrança continua desigual, a falta de segurança viária permanece sem solução adequada, e as medidas compensatórias ainda não foram apresentadas de forma concreta.
As denúncias e encaminhamentos da audiência estão sendo formalmente enviados aos Ministérios competentes para investigação e adoção de medidas administrativas, legislativas e judiciais.