Por Welitton Gerolane
Por mais que nós petistas tenhamos convicção que o modelo de organização partidária com divisão interna em correntes ideológicas nos coloque em um permanente exercício de autocrítica – que outros partidos sequer almejam estar – e que este exercício tenha se aprofundado no período pós golpe de 16 inclusive com reflexo direto na eleição de uma direção partidária muito mais militante do que a que a antecedeu, é preciso reconhecer, ainda a tempo de corrigir, que em alguns aspectos deste exercício nós falhamos.
Por isso, escrevo este ensaio identificando 3 dos aspectos em que falhamos, e que julgo fundamentais para a derrota eleitoral que tivemos, mas sem a mínima intenção de transferir a culpa do complexo fenômeno político que elegeu Bolsonaro Presidente da República integralmente para o PT, como tentam outros setores, mas com a sincera e militante vontade de elucidar os desafios que se colocam para a militância do PT no próximo período.
O primeiro e mais determinante deles é o afastamento que teve o PT das periferias das grandes cidades, e da classe trabalhadora. E aqui é importante indicar que esse afastamento não se deu com relação as pautas ou os anseios da classe trabalhadora, mas fisicamente. Nós em algum momento acreditamos que bastava a atuação do PT no Governo ou no Congresso Nacional em defesa dos direitos da classe trabalhadora e voltar de 4 em 4 anos anunciando do microfone da pipoqueira as conquistas do último período para que a periferia continuasse votando no PT.
O erro disso, foi esquecermos que para fazer política é necessário criar e manter laços efetivos com a comunidade, é preciso conhecer e valorizar as lideranças locais, é necessário conviver com as pessoas e ser visto como um igual. Afinal, foi exatamente isso que fez o PT e as suas lideranças chegarem ao patamar positivo que chegaram.
O PT perdeu espaço territorial, e por mais que não tenha deixado de lutar pelo que sempre lutou, deixou de estar onde sempre esteve. O preço disso foi o crescimento do pensamento conservador nos locais que por um tempo foram redutos eleitorais da esquerda e do PT, e a facilidade com a qual se espalharam as notícias falsas e mentirosas antes e durante a campanha eleitoral.
Com isso chegamos ao segundo aspecto em que erramos, e que se cristaliza com a derrota que o PT teve ao subestimar o papel das redes sociais nesse processo eleitoral.
Nós excluímos das redes sociais quem pensava diferente da gente, saímos de todos os grupos onde tivesse alguém que discordasse de nós, deixamos os grupos da faculdade, do trabalho, do futebol, dos amigos e da família se tornarem monopolizados pelo pensamento reacionário e conservador. O preço foi o mais caro possível.
Eles, do outro lado, criaram milhares de grupos, financiaram uma nova comunicação interativa e independente das grandes corporações midiáticas e criaram uma rede por onde puderam livremente difundir as fake news e o seu jeito de pensar.
Fomos visivelmente derrotados na inglória disputa entre o palavrão irreverente da direita e o nosso textão arrogante.
Mas mais do isso, o terceiro elemento que contribuiu para que perdêssemos a disputa da narrativa foi o afastamento da retórica petista da luta de classes, porque esse foi o elemento que nos fez perder a identidade que construímos ao longo dos anos.
Isso porque enquanto, com muita razão, ao ver que os reflexos da exploração da força do trabalho eram sentidos com maior expressão em determinados grupos sociais, setorizamos o nosso discurso ao ponto de perder o canal de dialogo com brasileiro médio.
Discutimos muito pouco ao longo dos últimos anos sobre geração de emprego e renda, sobre moradia digna, o preço da comida no supermercado, e as condições materiais de existência do povo trabalhador; afastamos do nosso discurso os debates sobre o fomento a agricultura familiar, a justa distribuição da terra, ou a valorização dos alimentos produzidos pelo pequeno produtor; e quase nada falamos sobre a proteção as empresas nacionais, especialmente as estatais.
Depois de reiteradas eleições em que o termo mais demonizado e o mais bem-visto pelo eleitorado foram respectivamente “privatizações” e “trabalhadores”, perdemos uma eleição para uma candidatura cujo guru econômico falava abertamente em campanha sobre privatizar todas as estatais, e achaque a direitos trabalhistas. É impossível desassociar isso da mudança no nosso discurso.
Por certo que todos esses elementos são, junto com outros que não couberam no texto, corrigíveis. E que corrigi-los, bem como fazer a necessária transição geracional para melhor enfrentar a nova conjuntura, são tarefas da direção e da militância petista nesse novo período.
Nem tudo está perdido, a perspectiva futura é positiva e animadora, mas não dá para acreditar que o Governo Bolsonaro ser mal avaliado e o consequente retorno do PT são condições postas. É preciso construir para isso, disputando mentes e corações e corrigindo erros do passado.
Welitton Gerolane é membro da executiva estadual da JPT-PT do Paraná e estudante de Direito da UFPR.