“Canalhas”, diz juiz Appio, que substituiu Moro na 13ª Vara, sobre a Lava Jato e golpistas

O juiz Eduardo Appio, que ocupou por quatro meses o posto que era de Sergio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba, classificou como canalhas os atores do plano golpista, revelado esta semana, que resultou no indiciamento de 37 pessoas, entre as quais Bolsonaro, Braga Neto e diversos militares de alta patente. Para o magistrado, a Lava Jato é responsável pela ascensão da extrema-direita no país.

As declarações aconteceram durante o lançamento do livro “Tudo por dinheiro: a ganância da Lavajato”, realizado nesta quinta-feira, dia 21, em Curitiba.

“Os indiciados especializaram-se em conspirar contra a nossa soberania, grupo no qual eu incluo a Lava Jato, que nasceu em Curitiba, esta bela cidade que, infelizmente, tem de conviver com a semente do fascismo, que floresceu e rendeu frutos. Temos de reavaliar o que foi feito e toda a perseguição política”.

“Sempre serão canalhas e vendilhões naquilo que temos de mais sagrado, que é o nosso orgulho, nossa soberania e o nosso direito de sermos brasileiros. Para que esse “viralatismo” num país da grandiosidade do Brasil, com os recursos e dinamismo que temos?”, comentou o juiz.

O juiz também relembrou os quatro meses em que passou na 13ª Vara Federal , e disse que seu enfrentamento à Lava Jato começou 10 anos antes. Ele reafirmou que a prisão de Lula foi ilegal e disse que Moro, Dallagnol e outros lavajatistas foram para os Estados Unidos financiados pelos cofres públicos, com salários integrais e férias, para voltar de lá com a “cabeça feita” para se vender e repassar informações estratégicas para os norte-americanos. “Fartaram-se em em diárias e passagens executivas e propiciaram o surgimento desses personagens [da extrema-direita]”.

Appio ainda comentou os recursos bilionários que a Lava Jato pretendia empregar num fundo e disse que qualquer juiz que tenta desviar o mínimo valor é desligado sumariamente. “São R$ 6 bilhões que em quase sua totalidade foram para os Estados Unidos para pagar indenizações bilionárias da Petrobras para os acionistas norte-americanos. A outra metade viria para a Fundação Lava Jato”.

Plano Golpista

“Quando eu penso nos militares que conspiraram para conspirar para assassinar um presidente, um vice-presidente e um ministro do STF a expressão correta é essa: tubos depuradores de merda. É por isso que são obcecados, como o Bolsonaro, por esses assuntos exóticos, por toda essa microfilia e criminalização que virou a política”.

O livro

O livro “Tudo por dinheiro: a ganância da Lavajato”, publicado pela editora Kotter, é baseado em entrevistas de Salvio Kotter junto ao juiz. A obra revela os bastidores da operação lava jato quando então juiz Eduardo Appio ocupava a 13ª Vara Federal, substituindo Sergio Moro.

A obra foi lançada pelo Museu da Lava Jato, pelo Instituto Memória, Legalidade e Justiça, com apoio do Museu da Democracia, projeto Ideclatra e do Defesa Da Classe Trabalhadora.

O livro mostra a A Ascensão e Queda da Lava Jato e como a operação se transformou de uma investigação anticorrupção em um jogo de poder e ganância, segundo Eduardo Appio.

A obra aborda como Eduardo Appio se tornou o juiz que desafiou o sistema, enfrentando as forças por trás da Lava Jato, expondo suas práticas ilegais e interesses ocultos.

Também estão no livro os verdadeiros beneficiados pela Lava Jato, em um sistema que explorou a justiça em troca de ganhos financeiros exorbitantes, e os Os Bastidores da Operação, resgatando casos emblemáticos como Tacla Duran e Tony Garcia, e como eles revelaram as práticas de extorsão dentro da Lava Jato, segundo Eduardo Appio.

Todo o processo teve início com o acordo de leniência da Camargo Corrêa, homologado por Sérgio Moro em 2015.

Ao criticar a Operação Lava Jato, Eduardo Appio afirma que ela “promoveu a impunidade no Brasil”. Em sua análise, embora a operação tenha exposto escândalos e denúncias de corrupção, a maioria dos grandes empresários envolvidos conseguiu evitar punições proporcionais aos seus crimes. Para ele, “os corruptores, especialmente os grandes empresários, saíram praticamente ilesos e impunes”, beneficiados por acordos de delação premiada que lhes garantiram penas leves, geralmente cumpridas em regime domiciliar.

Follow the money

A essência da crítica de Appio é que, sob o pretexto de combater a corrupção, o poder econômico prevaleceu. Aqueles com maior responsabilidade pelos crimes financeiros acabaram favorecidos por esses acordos judiciais, desde que contribuíssem para a “conta corrente consolidada” da 13ª Vara. Posteriormente, por meio de uma triangulação entre a Petrobras e o Departamento de Justiça dos EUA (DOJ), bilhões de reais seriam transferidos ao controle dos gestores da Lava Jato por meio de uma fundação privada, aprofundando ainda mais as suspeitas de desvio de finalidade da operação.

Tortura moderna

As prisões eram realizadas nas primeiras horas das manhãs de quinta-feira, estrategicamente programadas para que rendessem manchetes durante todo o fim de semana. Os detidos, algemados, eram levados de avião para Curitiba, onde desembarcavam e eram exibidos como troféus. Ao chegarem à carceragem da Polícia Federal em Curitiba, eram colocados em celas imundas, com colchonetes encharcados de urina e infestados de pulgas, sendo mantidos isolados de qualquer contato por algum tempo, especialmente com a família. Na segunda-feira pela manhã, eram chamados para acordos de delação.

Isso ocorreu em diversos casos, inclusive envolvendo idosas—avós presas na frente dos netos—que não tinham culpa, mas possuíam conhecimento de detalhes. No caso de Paulo Roberto da Costa, o primeiro preso da Lava Jato, foi-lhe negado o direito ao banho por vários dias, além de ameaçarem processar sua filha. Era uma espécie de “Guantánamo”. Concedi um habeas corpus a Paulo Roberto da Costa em abril de 2014 e, a partir daí, entrei para a lista negra dos inimigos da Lava Jato.

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