Estado brasileiro reconhece erro histórico e concede anistia política a Dilma Rousseff

Com informações da Agência Brasil

A Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania aprovou, nesta quinta-feira (22), o pedido de anistia política da ex-presidenta Dilma Rousseff. Em uma sessão histórica, o Estado brasileiro reconheceu formalmente a responsabilidade por sua perseguição, prisão ilegal, tortura e demissão por motivação política durante o regime militar, e pediu desculpas públicas à ex-militante e ex-chefe de Estado.

“Em nome do Estado brasileiro, lhe pedimos desculpas por todas as atrocidades que lhe causou o estado ditatorial: a senhora, à sua família, aos seus companheiros de luta e, ao fim, a toda a sociedade brasileira”, declarou Ana Maria Oliveira, presidente da Comissão e procuradora federal aposentada, durante a sessão plenária realizada em Brasília.

Dilma Rousseff, que atualmente preside o Novo Banco de Desenvolvimento (o banco do Brics), não pôde comparecer presencialmente, mas foi representada por ex-presos políticos e parlamentares como Maria do Rosário, Jandira Feghali e Érika Kokay. A sessão foi transmitida ao vivo pelo canal do ministério no YouTube.

Uma dívida histórica

O pedido de anistia foi inicialmente protocolado por Dilma em 2002, mas sua tramitação foi suspensa a pedido da própria requerente enquanto ocupava cargos de ministra e, posteriormente, presidenta da República. Após a negativa da Comissão em 2022, Dilma recorreu da decisão, cuja análise seguiu os critérios estabelecidos pela Portaria nº 652/2017, do Ministério da Justiça.

Em seu voto, o relator Rodrigo Lentz lembrou que Dilma foi vítima de “atos de exceção motivados exclusivamente por sua militância política em defesa da democracia, da educação e dos direitos sociais”. Perseguida por mais de 20 anos, ela foi presa em 1970, aos 22 anos, e submetida a um regime de tortura brutal: choques elétricos, pau de arara, palmatória, afogamento, privação de alimentos, nudez forçada e violência psicológica contínua.

“Descobri pela primeira vez que estava sozinha, encarei a morte e a solidão. Lembro-me do medo quando minha pele tremeu. As marcas da tortura fazem parte de mim”, relatou Dilma em um dos depoimentos lidos durante a sessão.

Indignação com perseguição prolongada

Mesmo após deixar a prisão, Dilma continuou sendo monitorada pelo Serviço Nacional de Informações (SNI) até o final da década de 1980. Em 1977, foi demitida da Fundação de Economia e Estatística (FEE) do Rio Grande do Sul após ter seu nome incluído, por ordem do então ministro do Exército, em uma lista de “comunistas infiltrados”.

A Comissão reconheceu que a demissão teve “motivação unicamente política”, e aprovou uma reparação econômica simbólica de R$ 100 mil — valor máximo previsto pela Constituição —, além do reconhecimento do tempo de serviço para fins previdenciários.

“O terror da tortura e do cárcere degradante foi apenas parte da violência institucional que Dilma Rousseff sofreu. A perseguição continuada, a vigilância do Estado, a exclusão profissional e a criminalização de suas ideias constituem um ataque sistêmico à democracia”, concluiu o relator.

Reparação e justiça de transição

A Comissão de Anistia, órgão de Estado responsável por reconhecer e reparar violações cometidas por agentes públicos entre 1946 e 1988, tem buscado reconstruir sua missão institucional após os anos de desmonte durante o governo Bolsonaro. Entre 2019 e 2022, cerca de 95% dos pedidos de anistia foram indeferidos — mais de 4 mil casos —, segundo dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Com a reestruturação promovida pela gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o colegiado retomou o papel de pilar da justiça de transição e da preservação da memória democrática do país.

“Hoje, o Brasil dá um passo simbólico e necessário para reconhecer os que lutaram contra o arbítrio e sofreram nas mãos de um Estado autoritário. Não há democracia plena sem memória, verdade e justiça”, afirmou Ana Maria Oliveira.

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